No 16.º episódio de Isto Não é Pera Doce, estivemos à conversa com a professora Luísa Fernandes, docente no Agrupamento de Escolas de Carcavelos, onde leciona Biologia, Geologia e Ciências Naturais e coordena o Projeto de Educação para a Saúde (PES). Afirma que trabalha numa escola de afetos, de amor, numa “escola piegas”, onde as pessoas gostam realmente de estar. Realizou um Doutoramento em Educação Positiva e foi finalista do Global Teacher Prize Portugal 2019. No decorrer do episódio, Luísa Fernandes explica-nos o que é a Educação Positiva e como é que operacionaliza este conceito nas suas aulas, para promover um ambiente de aprendizagem onde o bem-estar e a felicidade são componentes obrigatórias.
Afinal, o que é a Educação Positiva?
A Educação Positiva trata-se da educação convencional associada ao bem-estar, para que se possa ensinar e aprender num contexto no qual todas as partes se sentem bem. Vários são os estudos que confirmam que os alunos aprendem melhor quando gostam daquilo que estão a aprender, dos professores, da escola e, acima de tudo, quando gostam deles próprios.
Este conceito, associado à Psicologia Positiva, não deixa de ver aquilo que é considerado negativo mas valoriza mais o positivo, conseguindo, por isso, maximizar o potencial humano. Mas, como é que algo tão abstrato, à primeira vista, se coloca em prática numa sala de aula? A professora Luísa Fernandes começa por estudar os pontos fortes de todas as pessoas, sejam professores, alunos, funcionários, todos aqueles que estão dentro do sistema.
Para esta investigação, utiliza um survey, criado pelo psicólogo americano Martin Seligman, para identificar, medir e avaliar as 24 forças de carácter de cada indivíduo, associadas às seis grandes virtudes humanas, para descobrir qual é a principal força de carácter de cada pessoa. No caso de Luísa, a sua principal força de carácter está relacionada com a virtude e com a apreciação de beleza em tudo.
Eu estou a ver uma pessoa e estou a ver o seu melhor lado. E, dentro do possível, também vejo o meu melhor lado. Isso ajuda-me muito a superar um pouco os lados mais difíceis.
Depois de identificada essa principal força de caráter, a Educação Positiva entra em ação. Não deixando de lado as emoções negativas, foca-se nas emoções positivas para dar resposta às características mais negativas, que também fazem parte do nosso equilíbrio. Em função dessas dificuldades, a professora Luísa utiliza os vários pontos fortes, porque nenhum de nós apenas um, para ajudar os alunos a lidar com as suas dificuldades e “ajudá-los a ajudarem-se a eles próprios”.
Para se iniciar na investigação desta temática, Luísa encontrou muitos obstáculos pelo caminho. Enquanto que na escola onde leciona a adesão foi muita, no meio académico aconteceu, precisamente, o oposto. Foi bastante difícil encontrar um/a orientador/a que a guiasse na sua tese de Doutoramento, porque a Educação Positiva ainda é associada a algo com pouco rigor e pouca ciência, o que para a professora Luísa já é uma não questão.
Já existem estudos internacionais, particularmente na Austrália, o país de grande desenvolvimento desta temática, e a professora Luísa tem, inclusive, um curso de formação para professores, criado no âmbito da sua investigação, que originou excelentes resultados entre os docentes: melhoria do bem-estar e da resiliência, aumento da auto-confiança, entre outros traços positivos.
“Sentir o pulso” à sala de aula e proporcionar momentos de meditação e relaxamento
Quando inicia as suas aulas, é ritual da professora Luísa “sentir o pulso” à sala de aula para perceber como é que os alunos se estão a sentir naquele momento. Para ela, é importante lidar com eles em anos de grande ansiedade e stress como, por exemplo, em anos de exames nacionais. Fazendo uso da sua principal força de caráter, a tendência é a de acalmar os outros e, por isso, usa e abusa disso nas suas aulas.
Para além de se preparar para cada uma delas da melhor forma possível, salienta ainda que ensina o melhor que sabe e que procura com que coisas que gosta muito aconteçam.
Gosto muito de rir. Então, qualquer coisa que eu estou a ensinar, seja o que for, se for preciso eu faço um teatro (…) na base do improviso do momento. Eu vejo cada dia como se fosse uma vida e, no fim do dia, quando eu me deito, penso: “valeu a pena?”. E, a cada dia, eu tenho valido a pena.
Existem também outras componentes que para a professora Luísa são essenciais. Se, para uns professores, o barulho na sala de aula é algo impensável, para esta docente é algo que faz parte, para que os alunos participem e conversem uns com os outros. No passado, já tentou contornar esta questão, para que as suas aulas se assemelhassem às das maioria dos professores, mas não resultou. Se a parte afetiva é o seu ponto forte para quê contornar isso? Também a meditação está presente nas suas aulas e, agora, são os próprios alunos que lhe pedem esse momento de paragem.
Um dos sonhos da professora Luísa é a comunicação entre os vários professores, de forma a que se dê um “empurrão” para a utilização desta abordagem, que tem um impacto muito positivo nos alunos. Atualmente baseado nos bons resultados, Luísa sugere que, futuramente, se poderia fazer uma avaliação mais imersiva para estudar o impacto da educação positiva como, por exemplo, através dos níveis hormonais relacionados à ocitocina, para desenvolver estratégias mais adequadas à melhoria constante do ambiente de aprendizagem, mediante os sentimentos dos alunos.
Mudar a Escola “de baixo para cima”, a importância da Colaboração e Próximos Passos
O conceito de Educação Positiva ainda é vanguardista e, na opinião de Luísa, aqueles que estão na vanguarda demoram muito tempo a conseguir que aqueles não estão, façam aquilo que é vanguardista. Para que esse “modo pausa” não se prolongue, Luísa salienta que chegou a hora de mudar. Como? Oferecendo ferramentas e recursos àqueles que estão nas estruturas que motivem a mudança, que deve ser feita de “baixo para cima” e com a presença dos decision makers no terreno, colaborando com os pais e criando sinergias entre os vários elementos do sistema educacional. Essas são algumas das soluções que a professora detalha ao longo do episódio.
“Eu acho que era melhor mudar a escola de baixo para cima. (…) Porque as grandes mudanças vêm de baixo para cima. (…) As pessoas que vão para o poder acham que sabem muito de um terreno que não sabem ou que não sabem tanto.“
No final do episódio, Luísa deixa ainda uma mensagem para os professores que têm interesse nesta área e que querem saber mais para que, todos juntos, possam levar toda a gente a acreditar que ser feliz na escola, é possível (e obrigatório!).
Assista ao episódio na íntegra no YouTube ou nas plataformas de streaming (Spotify, iTunes ou Google Podcasts). Junte-se a nós numa conversa que vai, certamente, elevar os seus níveis de ocitocina!
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