No episódio 15 de Isto Não é Pera Doce, estivemos à conversa com o Padre Paulo Duarte, uma grande inspiração no que diz respeito a questões vocacionais. Hoje é Padre Jesuíta, mas já sonhou em ser veterinário, frequentou o curso de Ergonomia, foi secretário de bordo na Portugália, trabalhou numa receção e teve vários trabalhos de verão quando era jovem. Também já fez o curso de Filosofia, mestrado em Teologia Fundamental e publicou dois livros: Deus Como Tu e Rezar a Vida. O seu percurso pessoal foi uma constante descoberta, na qual não houve espaço para a linearidade, que lhe permitiu uma multiplicidade de experiências enriquecedoras e, por conseguinte, o pensar noutras possibilidades que o trouxeram até à espiritualidade.
A experiência da vida não é uma linearidade: é a combinação de diferentes realidades, pessoas e possibilidades
É frequente perguntarem-nos, desde pequeninos, “o que é que queres ser quando fores grande?”. Somos obrigados a pensar, desde cedo, na profissão que queremos exercer, sem ainda conhecermos, na íntegra, todos os nossos dons e talentos. Se, por essa altura, fizessem essa pergunta ao Padre Paulo Duarte ele, rapidamente, iria responder que queria ser veterinário. E porquê? Porque frequentava, regularmente, a casa dos avós, que tinham vários animais e isso era algo que o fascinava. De certo modo, a primeira profissão que navegou pela sua mente estava relacionada com aquilo que captava a sua atenção, naquele momento em particular.
Mas, o nosso percurso é uma soma de experiências e o Padre Paulo Duarte também praticava ginástica acrobática de competição, fez parte do teatro da escola, organizou algumas viagens enquanto delegado de turma e, como não se ocupava só com a questão pedagógica, as notas não foram suficientes para entrar em Medicina Veterinária. Foi por essa razão que concorreu a Ergonomia para, mais tarde, conseguir transferir-se para o curso que idealizava. Com 10 vagas por preencher, ele ficou em 11.º lugar e foi aí que percebeu que o seu percurso não passava, claramente, por aí.
Ainda assim e tendo bastante presente, mais uma vez, a sua experiência de vida, concorreu à Portugália, motivado por um discurso que realizou a bordo na sua viagem de finalistas e que fez sucesso entre os colegas. Mais tarde, conheceu os Jesuítas no Centro Universitário Padre António Vieira, em Lisboa, e ao fazer uma peregrinação, sentiu-se desafiado a algo mais.
Lembro-me quando tinha 5 anos que surgiu ser padre mas, rapidamente, se dissipou. E, mais tarde, quando desenvolvo um pouco mais a vida religiosa, também houve ali um bichinho a surgir. Mas não, veterinária era o que eu queria.
Motivado pela peregrinação, mas com um claro lembrete de que outrora já tinha pensado em seguir este caminho, o Padre Paulo Duarte decidiu aprofundar este sentido mais vocacional com o discernimento, que lhe parece um ingrediente essencial, mas em falta, no mundo da Educação.
A Importância do Silêncio: é algo que também se educa?
Para pensarmos com discernimento, precisamos de silêncio. Mais do que espiritual ou religioso, o Padre Paulo Duarte identifica o silêncio como uma necessidade biológica. Se precisamos de sono, é porque precisamos de um silêncio, de um acalmar. E, para que possamos digerir informações ou escutarmo-nos, precisamos realmente de viver o silêncio. Na ótica do Padre Paulo Duarte, isto é algo que também se educa e que começa pelo reconhecimento de que nós não somos máquinas. Nós, seres humanos, precisamos de tempo e espaço para que o cognitivo possa entrar em ação.
Não estamos habituados nem somos educados para ouvirmos os nossos ruídos interiores e, por isso, permitirmo-nos a escutá-los é um processo. E é nesse processo, em que deixamos a nossa interioridade vir ao de cima, que conseguimos perceber o nosso todo, que nada mais é que um aglomerado das nossas influências conscientes e inconscientes.
Mas não é só o silêncio que é importante. O não fazer nada também é essencial porque, por vezes, precisamos de parar e pensar para projetarmos o melhor naquilo que realmente importa.
Não somos educados para o não fazer nada e, quando nós não fazemos nada, parece que não somos pessoas. Mas o não fazer nada, faz parte da vida. Aliás, os italianos têm a famosa expressão “Dolce Far Niente”. (…) Hoje em dia, a projeção dos pais, das redes sociais, dos influencers, o ser melhor pai, melhor mãe, melhor educador… É muito perigoso porque projetamos incomparações quase impossíveis na nossa realidade concreta. E acabamos por projetar o melhor onde? Naquilo que é mais fácil, que é uma avaliação a partir de uma nota…
Para contrariar esta espiral, é importante educarmos as crianças e os jovens para descobrirem as suas competências, os seus talentos, a sua individualidade. Desta forma, serão não só mais seguros de si mesmos, como também irá aflorar um ambiente colaborativo e não uma competição.
Porque é que as Escolas não estão a ser bem-sucedidas na missão de ajudar os jovens a descobrir a sua vocação?
Para o Padre Paulo Duarte, há algo que é claro: estamos, atualmente, a viver um burnout coletivo, impulsionado pela pandemia, e o cansaço dos professores é evidente. Eles acompanham turmas e não educandos, e são impossibilitados de o fazer, nomeadamente, pelo excesso de burocracia. Repensar a Educação nesse sentido é fulcral para ajudar os alunos no seu caminho particular e para os auxiliar na descoberta vocacional e a atingir a realização. Isto requer que pensemos a educação a partir da humanização, para que possamos conhecer-nos enquanto corpo total, não descurando de nenhuma das nossas dimensões, e descobrir-nos plenos.
Reconhecer que as crianças e os adolescentes têm de ser isso mesmo, crianças e adolescentes, pode ser um dos primeiros passos, assim como fazermos mais e melhores perguntas ao longo do processo educativo.
Desafiar a dúvida, desafiar a questionar, desafiar a procura. Se eu não pergunto o que está para lá do monte, eu não me ponho a caminho. A dúvida, a inquietação, o suscitar o gosto de perguntar ou da curiosidade, também faz parte do nosso lugar enquanto educadores.
A descoberta é feita a partir disso mesmo, da inquietação, das perguntas. É importante não desvalorizarmos as descobertas das crianças e dos adolescentes mesmo que, aparentemente, seja algo que nos pareça absurdo. Se eles têm uma ideia ou uma proposta que os fazem acreditam que vão transformar o mundo, cabe-nos ajudá-los a balizar essa ideia ou proposta, auxiliando-os a abrir perspetivas e a crescer porque, com esse crescimento, a sociedade também crescerá.
Assista a este episódio para conhecer o percurso fascinante do Padre Paulo Duarte e, simultaneamente, para se inspirar para o silêncio e para não fazer nada. Por aqui, não julgamos. E achamos que este episódio será um Dolce Far Niente, que o vai ajudar a aclarar muito a mente. Venha connosco!
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